Tuesday, March 29, 2005



Terça, 29 de março, 2005

O problema das múltiplas escolhas

Estava para escrever sobre isso há tempos mas as coisas andam muito corridas por aqui.

O problema de se ter opções demais. Será que aquelas pessoas que vivem dizendo que a vida era mais fácil 30 anos atrás estão mesmo certas? Será que o ser humano não está "equipado" para lidar com a vida moderna? Ou será que tudo isso é somente uma tentativa de justificar erros pessoais na sociedade?

Esse artigo do Orson Scott Card fala exatamente sobre isso. Mais especificamente, fala sobre o livro O Paradoxo das escolhas, de Barry Schwartz.

A tese de Schwartz é que o aumento de opções em todas as áreas, das mais simples como comida e roupas até as mais complicadas como planos de saúde e investimentos financeiros, deixou a vida complexa demais para um certo grupo de pessoas.

Como diz o Orson Card, essa idéia parece absurda. Afinal, o aumento de alternativas somente reflete as diferenças entre cada indivíduo. Os avanços da sociedade sempre vão nessa direção. Como é que esse aumento de conforto pode ser prejudicial?

O problema está na maneira que os diferentes grupos tomam decisões. Segundo Schwartz, as pessoas estão divididas basicamente em dois tipos: Maximizers e Satisficers (algo como maximizadores e satisfazíveis).

Satisfazíveis são aqueles que, apesar de terem necessidades e gostos específicos, conseguem decidir o que querem e se contentam com sua decisão.

Já os Maximizadores são aqueles que sempre vivem procurando o melhor negócio. O melhor preço, a melhor qualidade, a maior conveniência. Sempre. Por definição, Maximizadores nunca estão satisfeitos.

Resumindo a história (o artigo dá vários exemplos), um maximizador nunca está feliz porque nunca está "done". Ele nunca para num emprego porque sempre acha que o emprego do vizinho é melhor. Nunca mantém um carro (e consequentemente nunca acaba de pagar o mesmo) porque um novo modelo, melhor e mais moderno, está sempre disponível. Muitos não conseguem escolher nem mesmo uma profissão, ou manter um relacionamento estável. A possibilidade do que eles não tem vale mais do que qualquer coisa.

O maior problema dos maximizadores é que seus objetivos sempre se tornam irreais. O Card não fala muito sobre isso (talvez o livro fale) mas os maximizadores que eu conheço nunca tem um plano definido. O plano é sempre implícito: achar (ser, estar) o melhor em tudo. Diferente de um perfeccionista, que busca ser o melhor em alguma área específica, o maximizador nunca está focalizado em nada.

Obviamente, a solução não é eliminar as opções, e sim diciplinar o universo de escolhas. O que pode ser muito difícil, já que esse tipo de conceito não é ensinado em lugar nenhum. Pelo contrário, nossa sociedade incita essa ilusão de "tudo ao mesmo tempo agora". E é talvez por isso que as religiões continuem fazendo tanto sucesso.

Enfim, vale a pena ler o artigo todo. O Orson Scott Card escreve muito bem. A última coluna dele, sobre Global warming, também esta ótima.

Thursday, March 24, 2005



Quinta, 24 de março, 2005

America!

Eu não tenho a Globo por aqui (custaria $50 por mês, mais do que eu pago por 110 canais) mas fiquei sabendo pelo pessoal do Brasil sobre essa nova novela, "America", e resolvi conferir o website deles. Logo que ouvi o nome já sabia que boa coisa não viria, mas eu me surpreendi. Para o pior, claro.

Tudo bem que novela é novela, mas esses esteriótipos são ridículos. A personagem que quer imigrar ilegalmente é uma tadinha (até ficharam ela!). Outros que conseguiram imigrar para os EUA não gostam, e tem muitos problemas. Bônus para a professora malvada. Vejam esse parágrafo:

"Se no Brasil é comum as crianças chamarem suas professoras de tia, nos Estados Unidos esse hábito é malvisto. Abraçar a professora? Nem pensar! Beijar a professora? Tudo bem, mas a cota de beijo é limitada a um por dia. Também não pode andar de mãos dadas com os coleguinhas. Contatos físicos, por mais inocentes e banais que sejam, devem ser evitados a todo custo."

Eu dei muita risada com essa da cota de beijos! E já imaginaram uma criança aqui chamando a professora de "aunt" e achando que a professora não atende por não ser carinhosa?? Esse pessoal tem uma imaginação incrível.

Engraçado também foi a opinião do Titio Sader. Ele também parece não ter gostado, mas como sempre, for all the wrong reasons. Afinal, é sempre mais fácil achar que certos países são mais ricos que outros por causa da "lógica do capital" do que por eficiência ou mérito.

Enquanto isso, no mundo real, os países do terceiro mundo continuam se beneficiando com a imigração do seu povo, especialmente para os EUA. Em 2004, o dinheiro enviado por imigrantes ultrapassou o investimento estrangeiro direto. Foi um total de US$ 46 bi, US$ 5,6 bi para o Brasil, e US$ 16,6 bi para o México.

Por último, vale lembrar que apesar de grave (especialmente para a segurança interna dos EUA) o problema dos imigrantes ilegais é exagerado pela mídia. Afinal, dos 35.7 milhões de estrangeiros nos EUA, 10.3 milhões são ilegais, ou seja, menos de 30%.

Sunday, March 20, 2005



Domingo, 20 de março, 2005

Schiavo e o "direito" à morte

Não sei como o caso Schiavo está sendo retratado pelo mundo, mas aqui nos Estados Unidos temos uma batalha jurídica de grandes dimensões. Muitos acreditam ser o Roe vs. Wade da eutanásia.

Argumentos de cada lado não faltam, mas uma coisa é certa: Não poderíamos ter uma decisão mais hipócrita e infeliz do que a atual.

Hipócrita e infeliz porque os que defendem o direito de que Schiavo morra são os mesmos que acham execuções de assassinos algo desumano e ilegal. Muito pior, aceitam que ela morra lentamente de fome, algo bárbaro. Do outro lado, a hipocrisia está na negação da rápida e indolor morte dada aos condenados à morte, e na obrigação da escolha entre vida assistida ou morte "natural" (ela vai estar sedada, mas isso não é garantia de que não vai sentir nada durante o longo processo).

De muitas formas essa disputa é descendente direta da questão do aborto. Ninguém quer pensar (ou admitir) que o Estado controla algo tão precioso como a decisão entre vida e morte. Prefere-se inventar subterfúgios (como não admitir a vida de um feto ou tentar adivinhar os desejos da Schiavo) do que tentar lidar com essa triste realidade de uma forma racional.

Só resta torcer para que ela realmente não sofra mais do que já sofreu.

Friday, March 18, 2005



Sexta, 18 de março, 2005

Liberal ou libertino?

Poucos sabem que o candidato do Partido Liberal americano, Michael Badnarik, ficou em terceiro na eleição do ano passado. Não é por menos, afinal ele recebeu somente 0.3% dos votos.

Eu acho que o potencial do PL no cenario político americano é enorme. Maior do que em qualquer outra época. Uma parte enorme dos republicanos não está satisfeita com a guinada populista da ala dos neocons, e uma parcela maior ainda dos democratas não aguenta mais ver o partido na mão da esquerda radical.

Esse editorial do WSJ ajuda a entender o porquê do PL não ter se aproveitado dessa situação, especialmente no que diz respeito aos republicanos. A imagem atual é uma das piores possíveis. E a culpa é só deles.

O problema maior é que eles focam no social e não no econômico. Como diz o editorial, passam a imagem de Partido Libertino. Talvez isso até funcionasse na década de 60, mas hoje em dia é suicídio.

Se o lado econômico fosse ressaltado, acho que eles seriam capazes de roubar uma parcela grande dos votos republicanos e independentes. É dali que viria a maior parte do poder. E com uma base de influência maior, as propostas sociais poderiam trazer alguns democratas moderados e até quem sabe outros desiludidos com os partidos menores como os verdes. Mas eles precisam entender que esses seriam uma minoria.

O Free State Project deveria ter dado a dica. Pelo que eu notei, a grande maioria das pessoas que está se mudando para New Hampshire vai atrás primeiramente de maior liberdade econômica. O lado social fica em segundo plano. Até porquê, por bem ou por mal, o povo americano é na maioria de centro/direita. Tanto é que os referendos sobre casamento gay falharam em todos os Estados, incluindo centros democratas como California e Oregon.

Como diria George Bush (pai): It's the Economy, Stupid!

Wednesday, March 16, 2005



Quarta, 16 de março, 2005

Deskafkainado

O livro desse mês do Clube de leituras do LLL na verdade foram dois: O Processo e A Metamorfose.

Eu já tinha o The Complete Stories (que inclui A Metamorfose) e planejava comprar o Processo. Não deu. Então minha opinião será somente sobre o primeiro, com o background de ter lido também a maioria das outras histórias do livro, como "The Penal Colony", "The Judgment" e "A Country Doctor".

Eu tinha lido A Metamorfose há muitos anos atrás, e tinha gostado muito. Eu lembro que achei a idéia da transformação em inseto algo bizarro, mas que de alguma forma poderia ser real. Talvez por ainda estar perto da minha adolescência, uma fase bizarra mas também bem real, tudo fazia sentido. Na época achei que Kafka conseguia passar essa situação de uma maneira única, com todo aquele clima de desespero, tensão e ao mesmo tempo complacência. Fiquei chateado quando o livro acabou.

A minha sensação ao reler A Metamorfose agora foi bem diferente. Não sei se é somente porque já conhecia a história, mas tudo me pareceu repetitivo. Ao invés de achar o livro curto como da primeira vez, me via contando as páginas até o final. Até mesmo a metáfora de estar preso no corpo do inseto me pareceu menos interessante. Não consegui ficar fantasiando sobre como ele poderia estar fugindo disso ou daquilo. Parecia claro demais que Kafka estava descrevendo alguém que fugia da vida em sí, do emprego, da família, de tudo. Querer identificar uma razão específica me pareceu ser um exercício de futilidade. A morte no final foi o fim perfeito para um enredo que me pareceu mais uma fantasia de suicídio do que qualquer outra coisa.

Pela primeira vez entendi como certas pessoas acham Kafka chato. Apesar de eu ter gostado de alguns dos outros contos, não fui até o final do livro. Todo aquele clima de sofrimento e reclamação estava me deixando louco.

Enfim, o que mais me chamou atenção nessa (re)leitura foi como podemos mudar tanto de opinião com o passar do tempo. Eu que me acho um cara estável, the same old fella, devo ter mudado muito e nem percebi. Será que eu gostaria dos outros livros que lí a cinco, dez anos atrás? E aqueles que lí no ano passado?

Ter percebido isso depois de ler A Metamorfose não deixa de ser irônico.

Friday, March 11, 2005



Sexta, 11 de março, 2005

Força vs Diplomacia

Interessante essa notícia de que o conselho islâmico da Espanha declarou uma "Fatwa" contra o Osama bin Laden.

A existência de Fatwas em sí é um absurdo. Mas considerando que essa é nossa realidade, essa reação contra o bin Laden pode ser algo positivo. Obviamente ele representa uma minoria radical, mas é uma minoria ativa. E além disso, a passividade da maioria muitas vezes soa como apoio. E nesse mundo de fantasias e símbolos religiosos, esse tipo de aceitação passiva faz muita diferença.

E considerando a divisão interna da Espanha depois do 3/11 (que matou 191 pessoas e feriu mais de 1,800), essa declaração do conselho islâmico chega a ser surpreendente.

O governo e o povo espanhol não se entendem em quase nada relacionado ao ataque. Alguns acham que foi tudo culpa do Aznar e seu apoio ao Bush, enquanto outros dizem que a Espanha sempre foi um alvo, e pagou pela sua falta de atenção. Quanto as reações ao ataque, alguns acham que a eleição do Zapatero, a retirada do Iraque e ineficiência da polícia (somente 28 dos 75 acusados foram presos) mostram o despreparo do País para lidar com o terrorismo. Outros, acham que todo cuidado é pouco para que a Europa não se transforme num campo de batalhas. Eles seguem o tal consenso de Madrid, definido por ninguém menos que Mr. Soros.

É a eterna briga entre os que acham que o terrorismo tem que ser combatido com força, e os que acreditam em soluções diplomáticas. Bem ou mal, o conselho islâmico da Espanha pelo menos escolheu seu lado.

Tuesday, March 08, 2005



Terça, 8 de março, 2005

O melhor programa americano sobre política

A minha lista de coisas em comum com o Bill Maher é bem curta: Somos vegetarianos, pró-environment, e brancos. And that's about it.

Apesar disso, o Real Time é um dos 3 programas que eu assisto religiosamente na TV. E o único sobre política.

A diferença entre o Maher e os outros apresentadores/pundits é que apesar de tudo, ele consegue colocar o programa na frente da ideologia. Ele tem lá suas teorias malucas e não pensa duas vezes antes de defender o seu lado, mas na maioria do tempo não parece estar tentando convencer ou converter ninguém. Ele é opinionated mas não obnoxious.

E com isso ele consegue dar mais espaço para os convidados. Apesar de manter no mínimo 2 dos 3 lugares para gente de esquerda, o representante da direita consegue quase sempre expor seu ponto de vista (um exemplo clássico foi quando o Andrew Sullivan detonou o Maher sobre Chomsky. Vejam o transcript aqui). Programas como o do Bill O'Reilly, com quem concordo 80% do tempo, caem muito rápido no 'preaching mode'. Os entrevistados passam muito tempo se degladiando ou concordando totalmente com o Bill, e no fim parece sempre a mesma história.

Sempre penso que o Real Time é um dos melhores exemplos de como o free speach ainda reina nos EUA. Quem acha que por aqui não se tem liberdade para falar sobre qualquer assunto precisa conferir.

Tentei descobrir se passa no Brasil mas não achei informação nenhuma. Alguém sabe?

Monday, March 07, 2005



Segunda, 7 de março, 2005

Guia de Blog do SobreSites

Meus agradecimentos ao Alexandre pela inclusão do seu humble correspondent (como diria Bill O'Reilly) no Guia de Blog do SobreSites , mais especificamente na página de Blogs Sobre Política.

O Guia é bem interessante, vale a pena conferir.

Friday, March 04, 2005



Sexta, 4 de março, 2005

Morde e assopra

Eu sei que o assunto é sério, mas não deixa de ser engraçado ler certas análises sobre a situação atual do Oriente Médio. Estou falando daquele pessoal que foi completamente contra a guerra, e que agora com as irrefutáveis mudanças que acontecem na região, está completamente confuso.

O Clóvis Rossi ontem e o Boris Fausto hoje são ótimos exemplos.

Vejam a confusão que fez o Clóvis Rossi:
"É óbvio que, sem a determinação norte-americana de depor Saddam Hussein e ameaçar fazer o mesmo com outros ditadores da região, muito dificilmente a "ordem congelada" teria começado o seu degelo.
É ruim que esses fatos, positivos, tenham vindo na esteira de uma ação ilegal como foi a ocupação do Iraque. Mas, já que vieram, é torcer para que os movimentos rumo à democracia se consolidem -e que não apenas se substituam os ditadores de plantão por governantes títeres dos Estados Unidos ou por ditadores que estavam na oposição e, só por isso, se faziam passar por democratas.
Volto ao paradoxo inicialmente citado: no Afeganistão, uma eleição que não chegou a atender padrões aceitáveis conferiu poder aos "chefes de guerra", que são talibãs sem fé no Islã, nada democráticos.
No Iraque, o caos gerado pela invasão norte-americana é tudo menos avanço rumo à democracia."


Entenderam? As invasões causaram todo esse rebuliço na região mas em sí não tem nada de democráticas! Essas outras reações aconteceram por... Mágica! Pura coincidência.

O Boris Fausto não fica atrás. Vejam só:
"Não há por que tomar as eleições iraquianas, pelo que já se ressaltou, como exemplo de êxito da implantação da democracia pela força das armas. O que não quer dizer que a simples realização de eleições não tenha representado um trunfo ideológico do governo americano junto à cidadania interna e, até certo ponto, junto aos países europeus.
Já nos casos da Palestina e do Egito, em que o pragmatismo incide em maior dose do que no Iraque, é significativo o papel das pressões do governo Bush, seja sobre Israel, para permitir condições mínimas de realização das eleições após a morte de Arafat, seja no sentido da abertura do regime egípcio. Não por acaso, o anúncio de Mubarak seguiu-se a uma recusa da secretária de Estado dos EUA, Condoleezza Rice, em ir ao Egito, após a prisão de um jornalista adversário do governo."


Quer dizer entao que as eleições iraquianas foram um "trunfo ideológico junto à cidadania interna e, até certo ponto, junto aos países europeus"??? Novamente, a reação na região foi por pura coincidência!!! Must be some kind of magic, magic! Esses bobões no Oriente Médio entenderam tudo errado... Foram inspirados por algo que não existe!

Aliás, esse texto do Boris Fausto é um exercício de morde e assopra. Ele acha que a grande participação popular no Iraque foi boa, pero no mucho. Ele acha que o Egito dá sinais de democratização, mas pode ser armação. Que os Palestinos sempre quiseram a democracia, mas que pode dar tudo para trás.

Dar o braço a torcer não é fácil.