Saturday, November 12, 2005

O burguês que não se importava com os meninos de rua

Toda essa discussão sobre liberdade vs igualdade, liberalismo vs socialismo, direita vs esquerda, não me incomoda. Eu acho esse conflito de idéias muito interessante. Fico sempre tentando analisar o porquê de certas pessoas pensarem de um certo jeito, como reações à certos fatos podem ser tão diferentes, etc.

Quer dizer, eu vejo tudo isso como um exercício de conhecimento.

Mas há um aspecto desses debates que realmente me incomoda: esse conceito de monopólio moral que a esquerda tenta provar que possui.

Essa semana na Folha (shocker), o Niemeyer (double shocker) escreveu esse texto que mostra bem do que estou falando. Esquerdistas se importam com os meninos de rua, a burguesia não se interessa pelo drama.

É a exploração de um dilema que, infelizmente, não é fácil de aceitar. Lembro que a primeira vez que me explicaram esse problema foi através de uma parábola. Era uma situação em que você e uma criança (ou qualquer pessoa mais fraca) estão perdidos no mar, e a maré está empurrando os dois em direção às pedras. Se você proteger a criança e sofrer o impacto direto, vai ficar desacordado e os dois morrerão afogados. Se a criança bater nas pedras, existe pelo menos a chance de você nadar até a praia e salvar a vida dos dois.

É um problema lógico e moral. Entender que a saída da pobreza possa depender da criação de ricos, por exemplo, não é simples. Aceitar que não existe solução mágica para a desigualdade social, e que sempre existirão pessoas comparativamente pobres, é mais difícil ainda. Nada é garantido. Nada é perfeito.

Essa é a "fraqueza" do capitalismo/liberalismo, e os progressistas exploram esse ponto sempre que possível. Acredito que na maioria das vezes, de forma inconsciente.

Perdi amigos de longa data por esse mesmo motivo. O problema não era que eles achavam que eu estivesse técnicamente errado, ou que eu não aceitasse discutir minhas teorias. A partir do momento em que eles percebiam que eu acreditava nas minhas teorias por convicção e não por ignorância, eles me julgavam uma pessoa fria, e me acusavam de estar somente preocupado com minha situação e não com a dos outros.

Um legítimo "burguês que não se importa com os meninos de rua".

6 comments:

Anonymous said...

Alex,

Veja isso:

http://www.ifcs.ufrj.br/~ppghis/pdf/joao_nobreza_bandos.pdf

Especialmente o capítulo 4.

Paulo,

Vários problemas têm dois lados. Esse aí tem um monte.

"Causas" podem atrair pessoas por bons ou maus motivos. A "causa" dos pobres atrai muita gente de boa índole, mas também oportunistas populistas dispostos a tirar vantagem da boa fé alheia.

Da mesma forma, porém, a ideologia do individualismo e da "mão invisível" é um prato cheio para aqueles que simplesmente não querem abrir mão de alguns privilégios de jeito nenhum, por mais que efetivamente muitas vezes a racionalidade recomende o contrário do "bom senso".

Sem entender isso, não dá pra entender muito do que é a política dos dias que correm.

Jorge Nobre said...

Entre os que "não querem abrir mão de alguns privilégios de jeito nenhum, por mais que efetivamente muitas vezes a racionalidade recomende o contrário do "bom senso"" os piores são os marajás do serviço público.

Anonymous said...

Vou linkar este post.

Anonymous said...

Paulo, você iria adorar o Thomas Sowell que também tece severas críticas à pretensa superioridade moral capturada da esquerda. Ele os chama de "the anointed", "os ungidos".

Talvez te interesse ler "The Vision of the Anointed: Self-Congratulation As a Basis for Social Policy". ;-)

http://www.amazon.com/gp/product/046508995X/104-9902318-2994318?v=glance&n=283155&s=books&v=glance

Anonymous said...

Paulo,

Dilema bobo. Mais interessante seria: imagine que a criança é o seu filho e as alternativas são a morte dele ou a morte dos dois. Quando as crianças são as dos outros é sempre mais fácil. :)

Abraços

Anonymous said...

E aí , Paulo ? ..."A morte dele ou a morte dos dois ?"
Rodrigo Guedes