Thursday, June 09, 2005


Quinta, 9 de junho, 2005

"Dutch Disease"

Esse artigo do Bresser chamado "Maldição dos recursos naturais" foi a primeira vez que ouvi falar dessa tal "Dutch Disease". Quer dizer, já tinha ouvido a essência da teoria outras vezes, mas não em termos econômicos.

Como não sou economista, resolvi chatear um de verdade. O Marcelo Tavares como sempre foi paciente, e explicou os detalhes. Acho que vale a pena postar para quem tiver interessado. Aqui vai:

"Dutch Disease é um fenomeno em que uma economia termina por concentrar muito da sua capacidade de produção na extração/produção de recursos naturais. Quando falo "muito" da sua capacidade de produção, estou falando de casos como Venezuela, Kuwait, Arábia Saudita, Chile em seus tempos de pobretão, etc. Países cujas economias dependem em elevadissimo grau de uma commodity para exportação.

Como funciona essa "doença"? Basicamente, a economia se calca fortemente em determinada commodity, essa commodity gera um volume enorme de exportações e entrada de divisas, que derruba o câmbio, o que incentiva as importações e diminui brutalmente a competitividade da industria interna dentro e fora do país. E como as taxas de retorno da commodity seriam superiores as da industria em geral, os recursos da economia terminam naturalmente sendo redirecionados para a commoditie em questão. Quando os preços se ajustam por alguma razão, a economia entra em crise profunda, e a recuperação é bastante complicada devido a concentração de recursos em um único setor. Isso é o que alguns economistas chamam de Dutch Disease.

No artigo, o Bresser, aquele do congelamento de preços e do milagre da multiplicação da inflação, tenta vender o seu maior fetiche: intervencionismo estatal.

O Bresser argumenta que os únicos fatores que fazem com que a agricultura brasileira seja competitiva são alta produtividade e eficiência, o que é uma mentira deslavada. As altas taxas de retorno da agricultura brasileira só são possíveis devido ao elevado subsídio que essa agricultura recebe, as linhas de crédito subsidiadas para exportação, e principalmente, pelo crédito barato e que não precisa ser reposto ao governo, condições as quais praticamente nenhum outro setor da economia tem acesso. Sem essas beneces, os outros setores da economia teriam condiçoes muito melhores pra disputar investimentos com a agricultura. Ou seja, a alocação de recursos para a agricultura no Brasil não é algo puramente natural, fruto de uma dádiva divina ou de vantagens comparativas, mas é uma alocação forçada, patrocinada pelo Estado.

Ou seja, se o Brasil sofre de Dutch Disease, trata-se de uma variante nova, a Dutch Disease estatal, com direito até a perdão de dívida devido a má alocação de recursos.

E tem mais. O comercio externo do Brasil é bastante pequeno em relação ao tamanho do PIB, e esse dinheiro só fica por aqui devido as altissimas taxas de juros reais que o país oferece. Esses dois fatores - convenientemente omitidos na simplificação do Bresser - somados aos subsídios oficiais (subsidios a uma atividade que, numa Dutch Disease, deveria ser tão magnanima que sozinha desequilibraria ao resto da economia) que só cresceram nos ultimos tempos, e a alocação forçada de recursos que o Estado promove a agricultura refutam completamente a noção de que o Brasil estaria com uma Dutch Disease.

É o velho mantra dos economistas estatistas ressurgindo das cinzas: "Ah, o Estado não está resolvendo, então coloca mais Estado que agora vai".

5 comments:

Anonymous said...

Só um adendo:

Eu não sou Economista. Apenas gosto e estudo o assunto.

Anonymous said...

Marcelo,
Economista nao precisa ser formado em universidade :-)
[]s

Anonymous said...

Basta ouvir "A voz do Brasil" pra ver o festival de subsídios que a agricultura recebe. Desde financiamento com juros bem abaixo dos de mercado até subsídio de seguro da lavoura. A agricultura é um negócio quase sem risco para muitos agricultores brasileiros.

Anonymous said...

Lamentavelmente para seu argumento, os subsídios recebidos pela agricultura são menores do que os recebidos por vários outros setores, inclusive os industriais. Veja os anexos da LOA, Lei Orçamentária Anual.

Também não entendi o que tem a ver o comércio com os juros altos.

abçs

Anonymous said...

Diogo,

É verdade, é muito menos subsidiada que as agriculturas americana e europeia, mas ainda sim é subsidiada.

Smart,

Existem sim outros setores subsidiados no Brasil que não a agricltura. O governo ao subsidiar a agricultura força sim alocação para este setor, e ponto. No caso de uma Dutch Disease, esse setor primário da economia deveria ser tão magnanimo que sem intervenção estatal alguma, ele absorveria parcela enorme da força produtiva do país. E se você tem um comércio exterior pequeno, esse setor não vai trazer divisas o suficiente pra desestabilizar todo o resto da economia.

Foi por omitir esses dois fatos, que eu achei a simplificação do Bresser grosseira.