Os radicais britânicos
Esse artigo do NYT sobre a origem dos radicais islâmicos no Reino Unido (traduzido aqui para assinantes do UOL) é bem interessante.
A lógica é a seguinte: Imigrantes do Sul da Ásia foram para Inglaterra durante o século passado em grande número. Eram na maioria pobres, e com baixa educação. Trabalharam nas indústrias, e conforme a economia inglesa foi mudando, foram dirigir taxis, montar suas lojas de conveniência, etc.
Essa primeira geração de imigrantes segue uma corrente islâmica de influência sufi, chamada Brelvi. São moderados, e gratos à Inglaterra por os ter recebido e dado oportunidade de trabalho e de liberdade religiosa.
Os filhos desses imigrantes formam a primeira geração educada na Inglaterra. São jovems que cresceram em bairros de classe média/média baixa, e que tiveram que lidar com oportunidades e problemas que seus pais não tiveram (drogas, gangues, sexualidade, ajuda do governo, etc).
Mas ao invés de considerar as causas desses problemas como sendo econômicas, esses jovens comecaram a achar que o faltava era espiritualidade. E quem é que veio salvar os jovens islâmicos das tentações da vida ocidental? O Super-islã! Não a versão civilizada dos seus pais, mas uma alternativa altamente rígida e ortodoxa, a escola Deoband (a mesma seguida pelo Talibã). Eventualmente esses jovens também desistiram da deoband, dizendo que sua abordagem para atrair mais seguidores era estreita demais, seu foco apolítico demais. Era preciso achar um Super-Islã mais poderoso.
A nova solução encontrada foi o salafismo, uma variação que se originou na Península Árabe no século 19 e ajudou a inspirar grupos como a Irmandade Muçulmana e a Al Qaeda. O salafismo exige pureza e rejeição de qualquer Islã exceto aquele dos primórdios, o que pode levar a profunda intolerância mesmo por outros muçulmanos como os xiitas.
Esses "novos convertidos" não somente viraram contra o seu país, mas também contra seus pais. Acham que eles foram subservientes e que sua versão do Islã é uma aberração. Do outro lado, os mais velhos acham que os jovens ficaram mal acustumados. Alguns vivem da ajuda do governo assim que viram adultos.
Enfim, essa é a idéia apresentada pelo artigo, e que na minha opinião, faz sentido. Lógico que a partir daí, pode-se chegar a inúmeras conclusões. A repórter meio que dá a entender que a culpa de tudo isso é da Inglaterra. O que não é novidade, já que muita gente acha que qualquer imigração é invariávelmente prejudicial, e sempre culpa das nações ricas que acabam recebendo esses mesmos imigrantes. E mais, acham que esses países deveriam criar enormes estruturas burocráticas para que os imigrantes se adaptassem 'culturalmente'.
Eu acho que essa é somente uma das muitas respostas fáceis, mas erradas. Primeiro de tudo, se problemas como esses imigrantes fossem tão enraizados na cultura islâmica, teriamos milhões de terroristas na Inglaterra, e não dezenas. Acho que choques culturais entre imigrantes é algo completamente normal, e nem sempre negativo. Essa fantasia explorada pelos radicais islâmicos pode até ter uma origem histórica, mas isso é só um disfarce de grandiosidade.
Oras, qualquer católico que veja seus amigos perdidos nas drogas pode dizer também que o problema é espiritual e não econômico. Essa noção de que o Islã tem um efeito mágico e radicalizador que outras religiões (ou culturas) não tem é um absurdo. E é um absurdo maior ainda achar que a única solução para uma eventual 'epidemia' desse extremismo é uma sensibilidade maior com qualquer islâmico.
Na verdade, vejo dois problemas distintos: o terrorismo patrocinado por estados, que precisa ser combatido no nível global (Talibã, Alqaeda, etc), e o terrorismo local, muitas vezes patrocinado pelos agente globais, mas em muitas outras levado a diante por simples malucos.
Esse último tem que ser combatido como crime, e como tal, corre perigo de cair na armadilha do relativismo exagerado. Querer achar explicações sociológicas para alguém que explode um ônibus com turistas para merecer suas 200 virgens no céu é um exercício de futilidade.